sexta-feira, 31 de março de 2017

Tablet

Estou de partida para fora do país e pensei que seria boa ideia ensinar a Avó a usar o Skype, no tablet. Tem corrido bem, até porque o tablet só tem o icone do Skype no ecrã principal. Não há que enganar... Ainda assim tenho de lhe dizer sempre para carregar no "S"!

Existem 5 passos:

1. Ligar o ecrã... Nunca vi ninguém a falhar um botão tanta vez...
2. Desbloquear o ecrã... Basta carregar no cadeado e deslizar para o lado. Ela esquece-se sempre do deslizar, mas depois nos passos seguintes quer deslizar sempre que é para carregar em qualquer coisa...
3. Carregar no "S"... Ela carrega sempre com demasiada força ou por demasiado tempo o que, ou não surte efeito, ou abre outras opções.
4. Carregar no nome da pessoa com quer falar... Aqui há novamente o desafio de ajustar a pressão do dedo e o tempo do pressionar...
5. Carregar na câmara de filmar... O desafio anterior mantém-se...

No outro dia, carregou sem querer no sítio das mensagens de texto do skype e quis aprender. Levou o seu tempo a escrever o que queria, procurando as letras no teclado. Sempre com o desafio do "carregar" associado. Depois disse-lhe que tinha de carregar no aviãozinho... Ela gostou disso, nunca se esquecia do aviãozinho! Por uns minutos andou nisso e eu pensava que estava a correr super bem... Até que me pergunta:

- Agora como é que envio?
- Então? Já está! Quando carregas no aviãozinho já estás a enviar!
- Ah! Ai sim? - Disse ela muito espantada!
- Sim! É instantêneo... São chamadas "mensagens instantâneas"... Assim que carregas no aviãozinho já está!
- Ah, e como é que apago isto? - disse ela apontando para a conversa que tinha iniciado...
- Não apagas... Isso são as mensagens que enviaste.
- Ah, não posso apagar?
- Não Vó... Ficam aí... Para sempre...
- Ah... - e entra em modo pensativo.

- Mas não precisas de nada disto! Basta carregares na câmara de filmar e falar! Não tens de saber escrever mensagens... Fixa só o resto.
- Ah 'tá bem... Tenho de escrever os passos num papelinho p'ra não me esquecer...

- E queres que te deixe a minha internet ou usas a da vizinha?
. Eu não tenho internet aqui!
- Sim, mas eu tenho! Deixava-te a minha...
- Ah, eu vou à vizinha que elas sabem mexer nestas coisas... Como é que isto se chama?
- Tablet.
- Aaah! Isto é que é a tablete?!

Clássico! - pensei eu. É claro que ela é uma dessas pessoas que diz "tablete"! Mas controlei-me e não corrigi. Ela estava demasiado contente por, finalmente, descobrir o que era "a tablete".


segunda-feira, 20 de março de 2017

Número de Telefone do Quarto

Há dias estava a tentar acordar o meu irmão, para um almoço de família, sem sucesso. Um almoço para celebrar o meu aniversário!

Intimidada, entrei mesmo no hotel onde ele estava hospedado e pedi para lhe ligarem para o quarto... Mas nada... Desesperada, fiz aquilo que estava há duas horas a evitar:

Telefonei à avó!

O número para o qual ligava estava desligado, mas podia dar-se o caso de ter o número errado. Assim pedi à avó que ligasse para o número pelo qual o meu irmão lhe tinha telefonado. Pensando ao mesmo tempo, se ela saberia ir às chamadas recebidas fazer isso... Mais tarde confirmei que não. A Avó telefonou a todos os números que tinha com o nome do meu irmão, sendo que numa dessas chamadas, atendeu-lhe um senhor da força aérea em Angola...

A Avó perguntou-me, com uma voz muito preocupada e dramática, se o meu irmão estaria doente...

Eu que já estava a fervilhar por dentro, com fome, sono, boca anestesiada do dentista, o facto de me sentir estúpida por ter de esperar na recepção de um hotel chiquérrimo até que conseguissem falar com ele, rodeada de ricos cheios de mania que me irritavam só por entrarem no hotel, quanto mais quando abriam a boca. E eu ali completamente fora de contexto no meio dessa gente, e depois de levar com uma pergunta do tipo "já tentou telefonar-lhe para o telemóvel?" em que tive de disfarçar a minha expressão facial traiçoeira e controlar um guturesco "DUH!" proveniente do fundo da minha alma... Não estava com paciência nenhuma para os filmes da avó (para compreenderem melhor, re-leiam http://sabedoriadavo.blogspot.pt/2016/02/como-funciona-mente-de-uma-avo.html) e não me contive mais:

- NÃO, VÓÓÓÓÒ!!!!! ELE ESTÁ É A DORMIR!!!! JÁ ESTOU HÁ DUAS HORAS A TENTAR TELEFONAR-LHE, JÁ ESTOU NO HOTEL HÁ UMA HORA, JÁ PEDI PARA LHE TELEFONAREM PARA O QUARTO DUAS VEZES... E NADA!!! ELE ESTÁ A DORMIR E NÃO OUVE! - isto controlando o volume da voz para não assustar as avestruzes, mas já não escondendo a minha cara profundamente irritada.

- Ah, tens de me dar esse número do quarto... Aí do hotel...

Nesse momento, fiquei incrivelmente calma, compreendendo que ela não fazia ideia de como as coisas funcionam... Respirei, fingi que não tinha ouvido e repeti que eu estava no hotel, que já tinham ligado para o quarto dele da recepção, mas que ele não atendeu. Que não, eles não podiam ir lá com a chave, que não podem fazer isso! Que é contra a lei! Que não, não conheço os colegas de trabalho dele, para lhes pedir para irem lá bater à porta...

Só que ela insistiu:

- Qual o número de telefone do quarto dele?



Já não me lembro o que respondi, mas ainda estava imersa naquela calma... A calma que vem quando o cérebro diz "Desisto! Não dá mais!"...  A calma antes da tempestade... E iria trovejar em cima do meu irmão, assim que lhe metesse os olhos em cima!

- Então tu matas o teu irmão?! - trouçou a Avó, quando lhe informei do meu plano...

Felizmente, não tardou muito mais até um jovem aparecer informando-me que:

- Já conseguimos contactar o seu irmão. Parece que ele estava mesmo a dormir...

Cheesecake

A sobremesa depois do almoço geralmente é uma escolha entre maçãs e laranjas. No entanto, hoje, a vizinha trouxe-nos um pedaço (bem grande) de bolo de morango e outro de cheesecake que ela própria fez. Estavam uma delícia, mas o cheesecake era simplesmente divinal!

- Ai, este cheesecake está mesmo bom!

- Esse quê?

- Cheesecake... É este bolo aqui... - apontei - Chama-se cheesecake.

Perante a expressão interrogativa da Avó percebi que queria que repetisse o nome para ouvir melhor:

- Cheesecake... - e outra vez - Cheesecake... - e outra vez - Cheesecake...

- Como é que é isso em Português?

- É cheesecake... - face à expressão facial dela, rapidamente acrescentei - Não há tradução, é assim que se chama...



Não ficou muito convencida. Não gosta destes nomes estrangeiros que damos às coisas...

sexta-feira, 17 de março de 2017

Loiça Quase Limpa

Regra geral, a televisão aqui nos avós está sempre ligada. No outro dia apanhei um anúncio de detergente de loiça que dizia algo como:

- Está farto de loiça quase limpa?

Imediatamente virei-me para a Avó:

- Olha! Sou eu!!! - e desatei a rir-me!

Aqui em casa dos avós a loiça está sempre quase limpa. Não há um prato, um copo, uma caneca, um talher se quer... Que esteja completamente limpo. Antes de comer o que quer que seja, tenho sempre de re-lavar a loiça, com o único esfregão limpo que têm. Eles teimam em lavar a loiça com um dos dois outros esfregões completamente pretos... O detergente que usam é topo do gama e rapidamente a loiça fica limpinha, se for bem esfregada. Mas como eles não vêem bem, fica sempre alguma comida incrustada.

No início não dizia nada e limitava-me a limpar "o sujo"... Mas a Avó troçava de mim, como se eu tivesse a ver coisas que não existem. Então agora eu falo e reclamo e digo que ela é que não vê bem! Ela ri-se na mesma...

Hoje depois de almoço a Avó desabafou:

- Ai, não me apetece nada lavar a loiça hoje!

Imediatamente aproveitei a deixa, talvez com demasiado entusiasmo:

- EU LAVO!!!!

- Ah, não lavas nada, deixa-te 'tar...

- NÃO! EU LAVO!!! Prefiro ser eu a lavar... - parecia que me estavam a dar um prémio!

Mas depois distraí-me com algo (que nem a Dory) e quando dei por mim, ouvi-a na cozinha a lavar a loiça... Perdi a minha oportunidade de OURO!

Por vezes o que faço, é lavar a loiça quando eles estão a dormir. Assim aumento a probabilidade de ela usar aquela mesma loiça (limpa!) no almoço do dia seguinte.

A avó não gosta que eu me meta a limpar, penso que a faz sentir-se mal. Por isso só o consigo fazer às escondidas...


Até ao presente, ela nunca reparou...

Diabetes

Estava a dar no noticiário uma notícia (lá está!), sobre diabéticos e pré-diabéticos.

- Sou eu! Eu sou pré-diabética! - disse ela com demasiado orgulho para meu gosto!

- Claro! Só bebes gasosas (refrigerantes)!!!

A Avó pensa que Sumol é sumo, que os sumos de pacote não fazem mal e que os Ice Tea são só chá... Além das coca-colas que não fazem mal, porque só bebe "uma vez ou outra".

- Oh, se eu morrer, morro... - diz ela enquanto enche o copo com mais "sumo".

Hoje a Avó foi ao "Lidli" e trouxe os seus "sumos".

Vou Passar À Mónica

Hoje recebeu um telefonema de um primo meu, que é praticamente filho dela. A alegria dela transbordava para fora! Não se conseguia conter!

Por infelicidade minha, tinha acabado de entrar em casa nesse momento e com as "garras" dela tentou pegar-me no braço, puxar-me para ela. Parecia uma águia a encaminhar-se para mim, com as mãos em forma de garras! E eu sentia-me uma galinha indefesa, desesperada em esquivar-me dali!

- É o XYZ! - disse ela com os lábios.

- Está bem, larga-me! Eu mal o conheço! - e fugi o mais depressa possível antes que me fizesse conversar com ele, como os adultos fazem às crianças!

Sempre detestei que a minha mãe me fizesse falar com pessoas ao telefone que eu não conhecia:

- É o teu primo, o teu tio, a não-sei-quantas... - dizia a mãe, ao passar-me o telefone, sempre com o cuidado de tapar o auscultador.
- Mas eu nunca os vi! Não os conheço!
- Mas eles querem-te dar um beijinho! São teus primos, tios, etc...
- Mas eu não os conheço!!!
- A Mónica está com vergonha de falar. Ela manda um beijinho e diz que tem muitas saudades!
- A sério?!

 Era criança, tinham-me ensinado a não falar com desconhecidos! Família ou não, se eu não conhecia, não queria falar! Porquê que os adultos se contradizem tanto?

Quero pensar que cresci e estou melhor... Mas hoje percebi que essa criança vive ainda em mim. As palavras "vou passar à Mónica" me aterrorizam, e eu antevia-as saírem dos lábios da Avó, se eu não desaparecesse do mapa naquele instante!


Carro Fora Da Garagem

Os avós tinham sempre o hábito de meter o carro dentro da garagem e queriam que eu fizesse o mesmo. Mas depois dos primeiros tempos, deixei-me disso. Assim posso sair e entrar sempre que quiser, sem ter nenhum carro a impedir-me. E também posso dormir até mais tarde, sem me preocupar em ir tirar o carro para o avô poder tirar o deles.

A Avó queria assustar-me, dizendo que mo podiam assaltar durante a noite. Eu recusei tal ideia. Sempre o deixei fora e nunca aconteceu nada. Ela teimava, dizendo que não estamos em Évora e que aqui há mais bandidos.

A verdade é que passado uns tempos, também eles passaram a deixar o carro fora. Acabou-se a trabalheira de abrir e fechar o portão e de fazer sinais para o avô não bater no muro ao entrar ou sair.

Parece que passado uns meses a ver que nada me acontecia ao carro, decidiram facilitar a vida deles também.


A melhor parte da história, é que a Avó nunca mais me chateou, por o carro estar fora da garagem!


Vegetais

Todos os dias me pergunta se quero café e eu digo sempre que não.

Hoje decidi explicar melhor:

- Não. Tem de se evitar... O café é ácido.

Como ela ficou a olhar para mim de forma pensativa, continuei:

- O café é ácido. Acidifica o sangue.

- O quê? - pergunta ela, aproximando a cara da minha para ouvir melhor.

- ACIDIFICA o sangue... Torna o sangue mais ácido...

Continuou a olhar para mim por isso continuei:

- É o café, as gorduras, o açúcar...

- Ah eu só ponho pocoxinho açúcar! Só pus duas colheres! - interrompeu ela...

- ... e o pão também!

Ui, o quê que eu fui dizer a uma Alentejana, que come pão (refinado) em todas as refeições!

- Oh! Assim o quê que uma pessoa come?! Nada! Agora uma pessoa não pode comer nada! - diz ela indignada.

- Podes comer peixe, carne (embora também seja ácida) e vegetais! Muitos vegetais!

- Eu já não posso ver os vegetais! Os vegetais... Eh! - disse ela com cara de nojo e saiu para ir fazer os cafés.



Coitada, só perguntou se eu queria café, e saiu dali a ouvir dizer que não se pode comer pão! 

Trump

Conversa depois de almoço:

- Já vou para os EUA para o mês que vem.
- E ele deixa?! Ele, o Maluco...
- O Trump?
- Sim! Ele não deixa as pessoas entrar! Ele anda a proibir os países todos!
- Não Vó... Isso é só para os países árabes!
- Mas nós temos muitos árabes...
- Oh Vó, não temos nada...
- Achas que entras? Não entras...
- Entro, sim! Já me disseram que sim! Já recebi a carta! Só falta a entrevista...
- Ah, não sei não...


Ela não quer acreditar que me vou embora e, contra os filmes que faz na sua cabeça, não há factos nem argumentos.

quarta-feira, 15 de março de 2017

Choveu Lama

Ontem ao final da tarde, enquanto passeava a cadela, reparei que os carros estavam cobertos de pólen. Pensei, para os meus botões, que a Primavera tinha oficialmente chegado.

O nosso passeio foi interrompido por uma chuva leve e assim, recolhemo-nos. Os avós já se tinham trancado em casa há uma hora atrás, com a televisão bem alta.

Esta manhã oiço a Avó pela janela, a falar com o avô (bem alto para ele ouvir). Dizia ela que tinha chovido lama e que os carros estavam todos sujos.

Mais tarde, diz-me ela:

- Olha, choveu lama! Choveu terra, ontem à noite!

Pensei em ficar calada, mas não aguentei e expliquei-lhe a história do pólen.

Ela simplesmente olhou para mim como que dizendo:

- Oh minha burra! Choveu lama! Tens sempre de me contrariar!

A minha resposta como sempre, foi um revirar de olhos e ir-me embora...

terça-feira, 14 de março de 2017

Já acordaste?

Todos os dias, sem falta, sempre que me vê pela primeira vez pergunta:

- Já acordaste?

Não importa o que fiz nessa manhã ou até mesmo nessa tarde. Posso até já ter saído e voltado de casa... Mas sempre que me vê sair do quarto pensa que acabei de acordar!

Ainda no outro dia o avô comentou que eu durmo muito... Lá por estar no quarto, não quer dizer que esteja a dormir! De onde é que ele tirou essa ideia? D'Avó!

Não há um dia que não me faça a pergunta:

- Já acordaste?

Ou então:

- Só acordaste agora?!

 Ontem tive de lutar contra o impulso de responder:

- Não! Estou na rua... A passear a cadela... Sonâmbula!!!


segunda-feira, 13 de março de 2017

Ah, és tu!

A Avó passa-me para as mãos uma pilha de roupa e fica a olhar para o chão, à procura do que teria caído...

- Vó, não caiu nada...

E ela continua a olhar a olhar, inclinando-se para tentar focar melhor o chão...

Devo dizer que estávamos num corredor com pouca luz, e que como ela vinda do exterior, ainda estava encadeada.

Mas ela não acreditou nas minhas palavras e continuou à procura... Por fim, lá diz:

- Ah, és tu! - para a minha cadela (castanha escura) que estava ali aos seus pés.

Brownie a fazer olhinhos